Memórias de muitos anos de reportagens. Reflexões sobre o presente. Saudades das redacções. Histórias.
Hakuna mkate kwa freaks.











quarta-feira, novembro 15, 2006

O bimbo do natal

À hora do almoço fui passear para o Chiado. É das mais interessantes zonas de Lisboa. Tem sempre uma multidão heterogénea, cosmopolita, muita gente com ar irreverente mesmo se todos andam obedientemente pelo passeio.
Estavam a montar as iluminações de natal. Umas bolas vermelhas plastificadas que, iluminadas por dentro, irão dar um efeito engraçado, de certeza. Os operários que estavam a fazer aquilo eram de uma empresa de Espinho. Vêm de longe, iluminar a capital… mas, digo-vos, sempre foi assim. Sempre vieram de Espinho, garanto-vos.Há 23 anos (o tempo voa…) estavam três dos melhores repórteres da RTP, no Rossio, a preparar o arranque de uma reportagem conjunta sobre “Lisboa à Noite”, discutíamos (eu, o Mário Lindolfo e o Paulo Dentinho) como fazer a ligação entre o trabalho dos três… e foi, então, que o Mário Lindolfo olhou para a copa de uma daquelas árvores que ainda lá estão e viu um homem pendurado lá em cima. Estava a desmontar as luzes do natal, disse o operário. E vinha de Espinho. Dormia numas arrecadações na Feira Popular, em Entrecampos. Era a primeira vez que estava em Lisboa. Tínhamos encontrado o elo de ligação para as nossas histórias! Desconfiado das nossas intenções, primeiro recusou-se a descer da árvore para falar connosco. Mesmo assim, convencemo-lo a alinhar, depois de muita conversa e da promessa de lhe pagarmos o incómodo. Cada um de nós iria levar aquele homem a conhecer um aspecto de Lisboa by night. Ele, que quando tinha saído de casa trouxera consigo o bilhete de identidade da sua senhora, para que ela não pudesse circular muito à vontade… durante duas noites inteirinhas não dormiu e aprendeu a conhecer Lisboa como poucos. Foi assim que ele foi às casas de fado do Bairro Alto, desceu com o piquete de emergência aos esgotos da cidade, provou a diferença entre vodka laranja e tinto carrascão, dançou com travestis no Finalmente e foi apanhado numa rusga no Intendente. O que aquele homem cresceu naquelas duas noites é algo difícil de explicar. No fim, aquele a quem chamávamos afectuosamente “bimbo”, na sua última entrevista, ao amanhecer do segundo dia, no Miradouro da Senhora do Monte, olhava para Lisboa e dizia, efectivamente…

13 comentários:

Paulo disse...

Efectivamente...
Desatei a rir. Muito. E depois achei que era engraçado voltar a encontrar o "bimbo". Aquelas noites, para ele, devem ser uma recordação tipo "Nova Iorque fora de Horas".
Efectivamente.

Ida disse...

É tão bom mudar de estação no fio das tuas memórias! Transporta-me um pouco para onde eu gostaria de estar e me tira a sensação de alijamento que me acomete tantas vezes.

Um encanto a história, mas sobretudo a lembrança que vcs três tiveram de proporcionar tal experiência a esse homem. Devem ser, mesmo, pessoas inesquecíveis nas memórias dele.

Diogo disse...

Deve ter sido uma experiência inolvidável. O «bimbo» viu mais em duas noites do que em duas décadas em Espinho.

inominável disse...

ó pá, não gosta da palavra bimbo aqui, mas o resto a história está demais...

agora imagina que a história começava assim:

"e foi, então, que o Mário Lindolfo olhou para a copa de uma daquelas árvores que ainda lá estão e viu um rapariga pendurada lá em cima. Estava a balouçar-se nas luzes de natal, disse ela. Era um pássaro. E vinha de Aveiro".

o que fariam?

LA disse...

Vocês os lisvoetas são fodidos... Ainda me lembro de há uns anos um lisvoeta me perguntar e se admirar de em Boticas também vermos os mesmo programas de tv no canal 1! Carlinhos, bimbos há em todos os lados, gajos que não sabem a diferença entre o vodka laranja e o tinto carrascão, também os encontrarás aí no próprio Chiado, lisvoetas puros!
Tu não armes uma guerra norte-sul, não digas essas coisas, não sejas vimvo!
Nós, em Boticas, também adoramos apanhar uns lisvoetas para efectivamente os fazer crescer!
Aparece, efectivamente...
luis

Isabela Figueiredo disse...

Fiquei ali bloqueada na parte sobre o BI da legítima...
Portanto, vamos lá ver, o homem olhou para Lisboa e pensou, "efectivamente, devia ter deixado o BI à Maria Emília para ela me pôr uns valentes e merecidos cornos!"

Não foi numas "arrecadações na Feira Popular, em Entrecampos" que o nunca descoberto estripador de prostitutas deixou uma das suas vítimas em bastante mau estado. Não estou a tentar fazer nenhuma ligação, mas há uns bons anos que não ouvia falar nas tais arrecadações.

Ida disse...

Prezado sr. CN,

Acabo de rolar de rir... não contava que tal acontecesse em um blog tão sério, jornalístico do melhor, tendendo a um exemplo de intelectualidade da mais alta relevância, bla, bla, bla... mas depois que a m'nina d'Abeiro e o outro senhor do Barreiro(?) cá puseram as impressões digitais... virou bagunça...

Mas também... tinhas que usar o tal do termo B.... que parece causar tanta espécie, até na m'nina Isabela???

Agradeço a todos, e ao sr. CN, évidemment, há tempos não ria tanto... tava a precisar!

Tá confirmado, a diversão vem de onde menos se espera! Abs!

Isabel Victor disse...

Oh "gr" a tua descrição de Espinho é de se lhe tirar o chapéu !

Até falas no Laranjeira, o mordaz e contundente Manuel Laranjeira,tão esquecido ...

Pois é ... "O Bimbo do Natal ", provavelmente conhecia tudo isso como espectador mas, concerteza, nunca ninguém se tinha ocupado dele com tanto esmero ! Daí o espanto, a constatação da diferença, o tal " efectivamente" ...

CN disse...

Nunca se coibam de comentar o que lhes der na real gana, meus amigos. Os de Boticas e os outros...

inominável disse...

Caramba... que é como quem diz em sotaque daqui "mein Got"... não pensei que se ficasse melindrado com tão pouco... Humor puxa humor e foi como disse a Idinha: "há tempos que não ria tanto!"... e Bombo é bm: sempre fresco e fofo, como vai dizendo o afamado slogan :)

Freira Babuska disse...

Pela primeira vez por aqui!
E se adorei a crónica, muito mais me diverti com os comentários.Ah! gente com raça,bairrista até dizer chega,graças a Deus.Atrevi-me...só para dizer..."viva o Porto, carago" que também por aqui anda na espia da boa leitura.
Um xi coração.

Carla Oliveira disse...

Tudo bem? estava a procura de imagens e vi que falam da empresa onde trabalho, Ainda bem que gostam das nossas criações.
Efectivamente iluminamos Lisboa desde "quase sempre".

Obrigada por falar de nós

Carla
cc_s_oliveira@hotmail.com

MeuXi disse...

Cheguei a este blog atrás do nome "Boticas" e como me fez rir resolvi deixar rasto. Até porque encontrei por aqui o Luis que conheço bem e descobri o seu "BLOGUEX".
É para lá que vou, mas prometo voltar.

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Jornalista; Licenciado em Relações Internacionais; Mestrando em Novos Média

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