Memórias de muitos anos de reportagens. Reflexões sobre o presente. Saudades das redacções. Histórias.
Hakuna mkate kwa freaks.











terça-feira, outubro 24, 2006

Memórias de um guerrilheiro

“Memórias de um guerrilheiro” é um livro espantoso. Não pela qualidade literária, que realmente não tem, mas pelo testemunho que dá dos últimos anos da vida de Savimbi.
O livro é um diário de Alcides Sakala, que começa em Dezembro de 1998 e termina uns dias depois da morte de Savimbi, em Março de 2002.

É o diário de uma viagem alucinante pelo centro e leste de Angola, grande parte feita a pé, de armas na mão, tentando evitar o inevitável: a derrota militar e a morte do líder da UNITA.
Inevitável porque Savimbi não percebeu que o mundo tinha mudado depois da desagregação da URSS. Savimbi parece ter acreditado que os aliados da UNITA jamais o atraiçoariam e não entendeu que seriam os amigos de ontem a espetar-lhe a faca nas costas. Ele, Savimbi, que consumia as biografias de todos os grandes estrategas e líderes mundiais, não foi capaz de prever o mais óbvio: que em política a traição se legitima pelos resultados que obtém.
Segundo Alcides Sakala, Savimbi foi atraiçoado por alguém que lhe era muito próximo e em quem ele confiava. O relato lança algumas pistas, mas não concretiza qualquer acusação. No final de contas, o traidor poderá ter sido o próprio autor, ou outro qualquer derrotado pela fome e por sacrifícios inimagináveis que este livro relata muito bem.


O livro trata alguns acontecimentos que testemunhei. Em 1998 passei o último semestre em Angola e, portanto, o diário de Sakala inicia-se quando eu ainda lá estava. Posso dizer, por isso, que este livro fala verdade. Talvez não, num ou noutro pormenor, ou quando toca as crenças mais profundas do autor, porque a fé tem muito pouco que ver com a verdade dos factos. Para já, apenas quero dizer que também penso que a opção militarista foi tomada, realmente, pelo governo de Angola. Foi de José Eduardo dos Santos e do seu círculo político-militar a responsabilidade pelo reacender da guerra. Isso foi dito, preto no branco, em Luanda, por vários ministros e chefes militares. Em 1998 não foi a UNITA a primeira a disparar, tal como julgo que não tinha sido em 1992, nos confrontos que inviabilizaram a 2ªvolta das eleições presidenciais e que resultaram no massacre de muitos quadros políticos da UNITA.

2 comentários:

Maria Romeiras disse...

Boa sugestão. Leitora compulsiva, vou à procura. Bons caminhos sugere quem sabe de letras e de vidas.

João Carlos Carranca disse...

A 1ª traição penso ter partido do próprio Savimbi - senhor da guerra que outra coisa mais não sabia fazer, arrastando consigo, quer pela oratória quer pelo medo, alguns que já estavam 'cansados' da vida que levavam. Há muito que estaria propriamente sozinho se não fosse esse medo.
Pode não ter sido a UNITA a dar o 1º tiro nas guerras aqui referidas, mas foi certo que foi quem criou o 'clima'.
Em Julho de 1975 a frase mais batidas nos Comités Provinciais era: Temos de arrazá-los, nem que para isso tenhamos que dar o corpo e a vida.

Acho bem, que aqueles que lhe eram próximos, que mudaram de vida, tenham a humildade de agora nos presentear com a sua verdade. Só assim se pode fazer HISTÓRIA

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Jornalista; Licenciado em Relações Internacionais; Mestrando em Novos Média

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