Memórias de muitos anos de reportagens. Reflexões sobre o presente. Saudades das redacções. Histórias.
Hakuna mkate kwa freaks.











terça-feira, outubro 31, 2006

A vantagem de ser brasileiro

Enquanto que no Brasil as eleições se resolveram em poucas horas, graças ao voto electrónico, no Congo estima-se que a contagem dos votos demore à volta de 20 dias. Os dois países equivalem-se em dimensão, mas o Brasil tem três vezes mais população e mil vezes mais organização e infraestruturas sociais. Brasileiros, é um orgulho ser vosso irmão.
No Congo, os votos são contados à mão, um por um. E depois será preciso ir a todas as aldeias, e são milhares, muitas em locais inacessíveis, recolher todos os votos e urnas para confirmar as contagens. Imagino que seja impossível evitar fraudes neste processo, mas acho que todos contam já com esse factor.
Parece-me que tudo acabará bem desde que Kabila vença. Parece-me ser essa a vontade da comunidade internacional, especialmente dos vizinhos Angola e Sudão.
Destas eleições africanas retenho o seguinte: o presidente Joseph Kabila é tratado como detentor legítimo do poder e o seu principal adversário Jean Pierre Bemba, como um senhor da guerra. Ora, sendo verdade que Bemba é um senhor da guerra, Kabila também é. Tomou o poder sem qualquer tipo de legitimidade, herdando o cadeirão do pai, assassinado no ano 2000 em circunstâncias nunca esclarecidas.

em Gbadolite, com um soldado de Bemba

Quando Laurent Kabila morreu, eu estava no Congo (com o João Duarte), no mato, perto da localidade de Bili, na província Equatoriale, precisamente território controlado por Bemba.


no acampamento no norte do Congo

Lembro-me de ouvir as notícias pela rádio. Estávamos todos de orelha colada aos transístores. Os congoleses que estavam ali connosco ficaram esperançados que a morte daquele homem fosse o fim da guerra civil, de que todos eles estavam fartos. O que se está a passar, só agora, seis anos depois, é o epílogo dessa esperança, o acto final de uma grande peça de marionetas cujos cordéis ninguém sabe bem quem manipula.

5 comentários:

Ida disse...

Fico pensando em como se sentirá, no silêncio, um profissional que pode trabalhar com roupas leves e descompromissadas como os shorts da foto, mas que deve ter, tantas vezes, a alma pesando chumbo pela gravidade das situações de que é testemunha. Bem curiosa condição.

para mim disse...

Pessoalmente discordo e tenho receio do voto electrónico. Já me disseram que não só é possível saber em quem votamos como ainda por cima é perfeitamente normal que se possa fazer manipulação de votos. Uma outra vez contaram-me que um certo presidente de junta, desejoso de saber em quem iria votar fulano, pegou no seu voto antes deste ir para a urna e marcou-o com a unha! Depois foi só abri-lo durante a contagem!... Por isso, não é o voto electrónico que me convencerá mais sobre o secretismo do acto...

Su disse...

gosto de passar por aqui e ler...ler a vida vivida
jocas maradas

Isabela Figueiredo disse...

Uma mulher não é de ferro.
Li o poste, sim senhor, pois vamos ver o que acontece a seguir; pois até me interesso pelo Congo e Política Internacional, etc, etc., mas, Carlos, Carlos, a foto com o pernão moreno bem torneado, fora dos calçanitos, ao lado do negro armado; oh Carlos, o pernão moreno, peludo, torneado é que prendeu a minha mais veemente atenção, e me alegrará neste dia tão cinzento. Ai, o pernão, Carlos!

Pedro Moita disse...

Relembrei-me do seu fantástico trabalho na selva do Congo com o João Duarte (de quem sou fã pelo seu trabalho em imagem),que um dia tive o prazer de ver na "saudosa" SIC.
De facto, como alguém aqui diz, o jornalismo televisivo em Portugal mudou. Aquela entrega ao trabalho em condições tão desumanas ficaram bem demontradas na vossa reportagem. Hoje dão-me saudades de ver peças televisivas como antes tinhamos nas grandes reportagens da SIC.
O seu nome é sem dúvida incontornável nas minhas lembranças de grande reportagem em TV.

Abraço de Cabo Verde.

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Jornalista; Licenciado em Relações Internacionais; Mestrando em Novos Média

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