Memórias de muitos anos de reportagens. Reflexões sobre o presente. Saudades das redacções. Histórias.
Hakuna mkate kwa freaks.











quarta-feira, fevereiro 18, 2009

Sonhos cortados

Orico Santos é aquele homem que se automutilou em frente a uma juíza, num gabinete do Tribunal da Figueira da Foz. Num gesto de protesto, deixou cair sobre a própria mão um machado que lhe cortou um dedo. Na altura, Orico tentava convencer a juíza a parar com um processo em que ele se sente espoliado de uma propriedade de 20 hectares, numa zona privilegiada em frente ao mar, em Buarcos, e com vista para a serra da Boa Viagem.
Praia de Buarcos, Figueira da Foz
Não conheço o senhor Orico Santos, mas conheço uma filha dele. A propósito desta cena e do que a seguir veio publicado em alguns jornais, recebi um email dela que aqui reproduzo em síntese.
“O meu pai usou do poder de agir, não tendo o poder da palavra. O golpe que lhe cortou um dedo, era para cortar um processo que começou há muitos anos, um processo de falsas promessas, de má-fé, de abuso de poder por parte da autarquia, de actos de vandalismo nunca castigados (dois incêndios em 10 anos), de uma auto-estrada que cortou a propriedade ao meio, de muita despesa com advogados e de muita resistência a tudo isto.
O meu pai nunca desistiu. Construiu uma barragem, irrigou as partes férteis da quinta, cuidou do eucaliptal. Sonhou uma vida sossegada com as filhas e os netos, mas outros sonharam com hotéis de luxo e campos de golfe.
O meu pai automutilou-se porque não encontrou outra maneira de se fazer entender. Ninguém quer ouvir a voz de um reformado agarrado à terra e às convicções. Essa é a minha tristeza e a minha revolta.
O dedo que lhe falta será sempre, para mim, o indicador da luta pelo direito à Justiça.”

Orico Santos é um homem quase só contra o "sistema". Nos jornais, rádios e televisões, um silêncio negligente abafa este terrível caso humano.

2 comentários:

Tiago Taron disse...

É impossível ficar-se indiferente a esta história. Grande Homem, enorme filha.

Maria João Carvalho disse...

A quinta da minha família na Serra da Boa Viagem, antes do Pessidónio, foi incendiada 12 vezes - dois fogos foram postos na mesma noite... os bombeiros estavam a regressar ao quartel, quando um telefonema os fez voltar lá acima, a outra frente, completaamente afastada. No dia seguinte, apareceu um "pato bravo" no escritório do meu pai a querer comprar "à força" a quinta. Não vendemos, terra é terra. Mas o plano de urbanização já nos "cortou a propriedae em três". A Serra está que dá dó: depois dos fogos vimos as construções rocambolescas que foram permitidas a construtores que andaram a desfigurar a Figueira e como prémio ainda têm vivendas onde havia árvores. Junto do Abrigo da Montanha, por exemplo.
Há muitos anos que a Figueira tem sido desgovernada por corruptos ou por gente que não ama a terra. A luta inglória dos expropriados dos terrenos da CIMPOR, no Cabo Mondego, é apenas um exemplo de quanto a Justiça é cega na Figueira da Foz e mesmo em todo o país. Construiram la uns caixotitos de pequenas janelas e com as paredes já todas rachadas antes, mesmo, que algum comprador se aventure. São uma s pequenas vivendas caríssimas e horrorosas.
Aproveito, já agora, para lembrar o que fizeram na Murtinheira, ao lado...parece outro jardim de patos bravos, m termos de construção...
Compreendo muito bem esse senhor, a filha e toda a família. O meu coração está com eles. Tenham coragem.

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Jornalista; Licenciado em Relações Internacionais; Mestrando em Novos Média

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