Memórias de muitos anos de reportagens. Reflexões sobre o presente. Saudades das redacções. Histórias.
Hakuna mkate kwa freaks.











terça-feira, fevereiro 03, 2009

Violência de hoje e de ontem (nas escolas)

Tinha ideia que, perante a Lei, os pais respondiam pelos filhos menores. Isto é, quando a criancinha parte uma jarra, os paizinhos têm de a pagar. Ou não? Se calhar não, porque se fosse realmente assim, as malfeitorias das criancinhas já não ficariam impunes...

Ao contrário do que tenho ouvido por aí, as agressões a professores não são um fenómeno recente. Quando eu era jovem inconsciente, também se agrediam professores. Em 1975, o Liceu Pedro Nunes era um campo de batalha. Defrontavam-se ali as várias juventudes partidárias e as várias classes sociais. Claro que a balbúrdia afectava tudo e todos e o comportamento geral deixava muito a desejar. A autoridade dos professores foi varrida pelos ventos da Liberdade e nem a polícia tinha mão naquilo. Aliás, naquele tempo, a polícia vivia encurralada nas esquadras, com medo até de sair à rua.
Lembro-me de entrar na aula de Matemática a abrir a porta da sala a pontapé. Era um dia de chuva copiosa e pingava água por todo o lado. Avancei agachado, com o chapéu-de-chuva fechado a imitar uma kalashnikov… espetei a ponta do chapéu na barriga do professor, como se fosse uma baioneta… o homem não teve coragem de abrir a boca, virou-se para o quadro e continuou a dar a aula, enquanto a sala rebentava em delírio demente… se me perguntarem porque diabo fiz eu aquilo, não tenho resposta.
Lembro-me de uma professora de Desenho (disciplina que eu não tive) ser molestada fisicamente por um grupo de alunos de direita, chateados porque achavam que as aulas dela eram comícios políticos de esquerda…
Lembro-me de um dia em que o director do liceu foi sovado e expulso a pontapé das instalações do Pedro Nunes, por um grupo afecto ao MRPP… e no dia seguinte a escola ser invadida por chaimites. Os militares fecharam o liceu, não deixaram ninguém sair até que o director, todo entrapado, veio reconhecer os agressores que foram detidos e enviados durante uns dias para Pinheiro da Cruz, onde eram acordados às cinco da manhã com um banho gelado de mangueira.
Outros tempos. Bastante mais violentos. Não eram estas historietas que hoje ocupam os tempos de antena das televisões, em reportagens indigentes que não têm nada para contar.

3 comentários:

Isabela Figueiredo disse...

Bem, o que tu relatas do teu tempo são conflitos e provocações políticas. Digamos que estavam a viver uma espécie de Maio de 78.
O que hoje se passa nas escolas é algo de outra ordem: existe violência física e psicológica, muito, ente alunos, pq para os alunos a autoridade do professor desapareceu na maior parte dos casos, portanto é natural que a violência chegue também aos professores. A campanha feita pela ministra da educação, com ajuda dos media, e com o dinheiro de todos, defendo a ideia de que os professores são uns incompetentes preguiçosos, não ajudou a arrebatar grandes simpatias da opinião pública, onde se encontram os encarregados de educação, que são, sim, responsáveis pelos seus menores.
Situações como esta são diárias. Acontecem 10 em cada escola, diariamente:
"Quando pedi para me dar a caderneta para enviar um recado ao encarregado de educação atirou-a contra mim, mas caiu no chão. Depois começou a atirar coisas para o chão e aos pontapés a elas".
Violência física, sinceramente, quase todos os professores admitem já ter sentido que poderia ter acontecido se não tivessem, enfim, controlado a situação, o que basicamente significa deixar o aluno fazer o que quer, deixar passar, fazer orelhas moucas e passar por cego e mudo.
É o que me ocorre dizer. Os professores deviam começar a ter subsídio de risco, sinceramente.

Unknown disse...

Concordo com a Isabela. Na adolescência do Carlos, vivia-se um período pós-Revolucionário, em que a Liberdade se confundia muitas vezes com vale-tudo; hoje em dia, é a actuação do governo, que desvalorizou uma profissão e esvaziou-a de autoridade para melhor impôr ideias e pontos de vista, a gerar fenómenos que nenhum de nós pode aceitar como normais. Daí a medida acertada do PGR, de tornar as agressões a professores crime público. E de facto, os profs deveriam ter direito a subsídio de risco ...

JPN disse...

E agora lembro-me que em 75 fechámos os profs no anfiteatro e não os deixámos sair enquanto não acabámos a Internacional, eheheheh. E também me lembro de que os professores de Música e de Moral não tinham a vida fácil, não. É engraçado que tenhas ido buscar essa época e que a Isabela te tenha respondido que a autoridade dos professores desapareceu na maior parte dos casos, porque era também exactamente isso que se passava, um tempo em que a autoridade não só não era reconhecida como facilmente tinha ressonâncias negativas. Só que, naquela altura, foi um tempo fora do tempo, não era a escola que estava a abanar, era a sociedade que -assumidamente - estremecia. Hoje a escola está a abanar mas está numa estrutura social que não reconhece que também ela está a estremecer e que por isso tem de dramatizar o estremecimento da escola. olha, a despropósito: Um abraço. Tenho saudades de te ver naquela pequena caixa.

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Jornalista; Licenciado em Relações Internacionais; Mestrando em Novos Média

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