Memórias de muitos anos de reportagens. Reflexões sobre o presente. Saudades das redacções. Histórias.
Hakuna mkate kwa freaks.
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terça-feira, julho 11, 2006
Angola, 1997. No Bailundo
Estive uma vez no Bailundo. Foi em 1997, quando Kofi Annan foi a Angola e viajou até ao Bailundo para conversar com Jonas Savimbi. O que os dois homens disseram um ao outro não sei ao certo, mas estou convencido que Savimbi desperdiçou a última oportunidade de vir a partilhar o poder com José Eduardo dos Santos. Acho que Savimbi não queria partilhar coisa nenhuma, acho que ele considerava ter o direito de exercer todo o poder e não apenas parte. Acho que José Eduardo dos Santos pensava da mesmíssima maneira e, assim, a viagem de Kofi Annan só poderia ser um fracasso político como foi, de resto.Gostei muito daquelas horas passadas no Bailundo. Foi interessante verificar como Kofi Annan tratava Savimbi em público, como se o angolano fosse a pessoa mais importante do Mundo. De certo modo, até era. Pelo menos, naquele momento e naquele lugar, era, de facto. Foi igualmente interessante ver como o povo do Bailundo temia aquele chefe. Nunca antes tinha estado com gente tão silenciosa e de olhos tão em baixo. Foi muito interessante, também, apreciar a arrogância de Savimbi quando, depois de terminada a reunião, foi à varanda do 1º piso mostrar Kofi Annan ao povo e discursou em umbundo. Nem uma palavra em português ou inglês, nem mesmo por cortesia com o convidado ou os vários jornalistas estrangeiros que ali estavam ou, até, pelos jornalistas angolanos que não falassem aquele dialecto.Mas também sei que a tradição ainda é um valor real para os povos que vivem longe das influências globalizantes do Mundo moderno e, por isso, percebo que não se possa confundir a obediência revelada por aquelas pessoas apenas com temor. O respeito pelas hierarquias, o respeito pela idade ou pela fama do outro, elementos da cultura tradicional dos povos bantu, ajudam a uma certa passividade perante o chefe. É um modo de se evitarem conflitos, que funciona desde que não seja o próprio chefe a causá-los.
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Acerca de mim
- CN
- Jornalista; Licenciado em Relações Internacionais; Mestrando em Novos Média
6 comentários:
Pedagógico, como sempre.
E, como sempre, gostei muito.
Pelo que percebo, muitos dos conflitos em África passam pela origem das tribos e etnias.
Esses países foram colonizados, e muitas vezes as tribos traíam-se umas às outras em favor dos colonos, e em troca de terras e da supremacia sobre tribos rivais.
Com o tempo foram acumulando contas por pagar, umas às outras.
E como é comum, aparecem sempre os aproveitadores, ávidos de poder e ambição, que se aproveitam desses sentimentos do povo para tirarem proveito próprio, manobrando-os.
"É a ambição."
Creio mesmo que era essa a frase que falava uma criança angolana, numa reportagem, creio que da SIC, acerca das crianças de Angola e das de Moçambique.
Dividir para reinar, conceito tão antigo como o mundo. Eu gostava de Savimbi, podia ser o diabo, mas eu gostava do homem. Bom post, amigo Carlos, pra não variar.
Só o que é relatado na primeira pessoa, consegue passar a emoção dos factos, por isso admiro muito os reporters.
Savimbi, possilvelmente, jogava a sua cartada, só que do seu baralho tinham sido retirados os trunfos.
Um abraço. Augusto
Savimbi no mesmo patamar de Jo´se Eduardo? Aí o Carlos Narciso não compreendeu bem a coisa. O Savimbi er um monstro que envergonha África. Falava em umbundu para poder insultar à vontade toda gente e até os hóspedes, como fizera com Blondin Beye, quando num comicio do mesmo género do relatado, perguntava à multidão se um homem de saias podia dar ordens aos angolanos, ou quando dirigiu insultos em umbundu a Madeleine Albright. Como o Savimbi era burro(embora com alguma astúcia)e megalómano, esqueceu-se que havia ssmpre alguém entre as comitivas que falava a língua umbundu(que não é um dialecto).
Parabéns por "caçar" bem essa África que os eusropeus desconhecem em absoluto.
tenho tudo registado em video - se quiseres. adorava ter copias das fotos tb. abraços maaf
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