Aqui há tempos redescobri umas fotos de Durban. Estive lá em 2000, quando se realizou uma conferência internacional sobre SIDA. Foi uma experiência muito gratificante, até porque tive oportunidade de ouvir falar Nelson Mandela, de facto, um homem diferente.
Mas esses dias que passei na África do Sul deram, ainda, para perceber alguma coisa do que se estava a passar no país. Depois do apartheid ter sido desmantelado, seria lógico que começasse a surgir uma elite social negra. E isso era visível, por todo o lado. Nas auto-estradas, já se notavam muitos carrões de último modelo, daquelas marcas do costume: BMW, Mercedes, Audi, Nissan, etc. Nas ruas, os enfatados. Nas zonas comerciais, muito movimento. Os motoristas de táxi, no aeroporto, era quase todos brancos. No centro da cidade, também vi pedintes brancos. E vi vários brancos com cartazes pendurados no peito e nas costas a pedir emprego. A pobreza e as dificuldades não cabiam já só aos negros, como dantes.
downtown
Percebi, também, em conversas com quem lá vive, que o novo regime sul-africano decretou aquilo a que chamam “”política de acção afirmativa”, que mais não é senão uma discriminação exercida sobre os brancos, de modo a favorecerem os negros na obtenção de empregos ou nomeação para cargos directivos. Uma lei que pretende equilibrar as injustiças do passado, reservando cargos a todos os níveis das empresas públicas e privadas para a população não-branca. A legislação estabelece que, perante várias candidaturas a determinado lugar, os não-brancos têm sempre preferência na admissão, a não ser que os candidatos brancos possuam maiores habilitações técnico-profissionais, ou que para determinada posição não exista qualquer candidato não-branco com habilitações semelhantes ao do concorrente branco. A aplicação prática da lei tem gerado uma insatisfação crescente entre os brancos, que na prática são impedidos de concorrer a lugares de nível médio e superior nas empresas, uma vez que mesmo em casos em que possuem mais habilitações, acabam por ser preteridos.
Contou-me um jornalista português que vive em Joanesburgo que uma prima tinha concorrido para uma vaga num banco e que lhe tinham dito, logo à partida, que não valia a pena inscrever-se porque nenhum branco ia ficar com aquela vaga, por mais qualificado que fosse.
Pelo que sei, nada mudou, desde então. A tal “política de acção afirmativa” continua a ser exercida e não se sabe quando deixará de haver discriminação contra os brancos na África do Sul.
Contou-me um jornalista português que vive em Joanesburgo que uma prima tinha concorrido para uma vaga num banco e que lhe tinham dito, logo à partida, que não valia a pena inscrever-se porque nenhum branco ia ficar com aquela vaga, por mais qualificado que fosse.
Pelo que sei, nada mudou, desde então. A tal “política de acção afirmativa” continua a ser exercida e não se sabe quando deixará de haver discriminação contra os brancos na África do Sul.
porto de Durban
Julgo que seria tempo disso acabar. Acho que o país só poderá piorar se essa discriminação não for abolida. Digamos que, sem querer pegar nos chavões do costume (a economia, o politicamente correcto, os Direitos Humanos), acho que é um péssimo exemplo educacional para as novas gerações de sul-africanos. Se, dantes, o apartheid era um regime abjecto, não me parece que, hoje, as coisas caminhem de forma muito diferente. Os sul-africanos estão a formar novas gerações de racistas. Tanto negros como brancos.
9 comentários:
Corrija lá a gralhazita no último parágrafo. Estas coisas não ficam bem no meu blog preferido.
qual delas?
Os brancos que se cuidem...
Com tudo isso, quem perde é o próprio país.
Imagino as pessoas válidas que já abandonaram a África do Sul por causa deste "novo apartheid".
Jota, digamos que foi um lapso... do qual me penitencio. Obrigado pelo reparo. Um ABRAÇO.
CN, tenho andado um pouco afastada da blogosfera, mas tenho que lhe dizer que este seu novo template torna os textos ainda mais apetecíveis e valoriza as fotos! Já tinha saudades da escrita ...
1. Foste a Durban tirar fotos para um catálogo de moda, não tentes enganar-nos! Estás inscrito numa agência para fazeres de Martini man, que eu bem vejo!
2. Eu conheço a África do Sul dos finais de 60, primeira metade de 70. O apartheid espantava-nos a nós, brancos, colonos. Passávamos a vida a entrar nas lojas e transportes públicos dos negros, e a ser mandados sair, não porque não pudéssemos, mas porque não era digno. Joanesburgo tinha um clima muito temperado, e havia alturas do ano com frio, pelo que cheguei a ter uma boina de lã, lindíssima, comprada, sem querer, numa loja de negros. O apartheid era um bloco de cimento sobre todos, insustentável. Em Moçambique sempre se disse, entre brancos, que quando os negros sul-africanos se tornassem livres "havia de ser uma chacina". Uso a expressão que ouvi, tal como a ouvi. A forma como negros foram tratados, na África do Sul, gerou muito ódio, e ele estava coalhado em cima, como nata, esperando que alguém bebesse daquela malga. E havia de beber-se.
3. Quando me dizes que viste pedintes brancos, brancos desempregados, pedindo emprego na rua, mal posso acreditar. Na África de Sul (como na África inteira) há imensos brancos africanos, que têm tanto direito a estar naquele lugar e a ter as mesmas oportunidades como os negros, logicamente. A vingança gera retaliação e o mundo não precisa de mais confusão. Em Portugal já sabemos como é.
Estimado CN, não há nada como escrever sobre aquilo que se viveu..
Este post é um excelente exemplo disso.
Um abraço
AG (O Diplomata)
PS: Entretanto, não esqueci o repto que me lançou para uma opinião sobre Timor.
Não sou sul-africana, mas sou angolana, um país também já colonizado. Obviamente que não concordo com este novo "Apartheid" na África do Sul mas consigo perceber os motivos da sua existência. O ser humano é um ser reactivo e as suas acções advêm sempe que situações previas. O racismo dos negros contra os brancos é um racismo reactivo fruto dos graves erros do passado colonizador.
Formei-me em Portugal, um país que decididamente posso chamar de paraíso em termos de racismo pois nunca senti na pele, pelo menos nao directamente...
Nunca senti o que é o colonialismo pois nasci num país já soberano. Contudo, sinto-me orgulhosa por saber que sou livre de tomar as minhas decisoes porque vivo num país independente. E na condição de cidadã nacional de um país soberano, é confortável saber que os meus interessas serão salvaguardados prioritariamente aos dos estrangeiros.
Mas para tal, não deveríamos cometer os mesmos erros do passado. É aí que eu gostaria de ver o orgulho e a soberania do povo angolano.
Nunca estive na África do Sul, mas fixei a "Desgraça" de Coetzee!
Não sei se seria possível, mesmo com Mandela, suprimir da memória e da fraqueza humanas os anos de apartheid, e ser magnânimo e justo. Acho que o equilíbrio vai ter que esperar pelo correr de algumas gerações.
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