Em 1989, Belém era uma cidade ocupada. Os soldados israelitas ocupavam os telhados das casas mais altas. Raramente se viam patrulhas nas ruas, mas dos telhados eles controlavam todos os movimentos da cidade.
Naquele dia, havia pedras a voar e tiros de gás lacrimogéneo, nas ruelas estreitas que desembocavam na praça principal da cidade, onde está a Igreja da Natividade.
Ainda assim, havia turistas por ali. Chegavam de camioneta, vindos de algum hotel de Jerusalém ou Telavive, paravam à porta da igreja e entravam. Não se passeava pela cidade, por causa dos distúrbios e isso afectava bastante o negócio dos comerciantes palestinianos.
Elias Freij era o presidente da câmara de Belém. Era um tipo importante, com uma história política longa. Recebeu-me em casa, porque naquele dia, como já disse, o ar da cidade estava cheio de fumo lacrimante… Tive, assim, oportunidade de conhecer um dos dirigentes palestinianos menos ortodoxos, se é que a palavra se pode aplicar… Freij era católico (presbeteriano?) e pertencia a uma família residente em Belém há mais de cinco séculos. Além de edil, tinha umas lojas onde se podiam comprar recordações locais como, por exemplo, garrafinhas com azeite e pequenas esculturas em pedra. Sempre foi um tipo influente, tanto no período do domínio inglês, no jordano ou no israelita. Freij era o único dirigente palestiniano que os israelitas não depuseram.
Quando estive com ele, já me pareceu um homem de movimentos lentos… não sei que idade tinha, nem sei se seria por causa da idade se apenas um hábito cauteloso adquirido pela experiência de quem sempre viveu a contar que o céu lhe iria cair na cabeça…
Mas tinha um espírito ágil. E falava do futuro com uma certeza inabalável. E para ele, o futuro era a independência da Palestina e a autodeterminação do seu povo. Era a isso que ele rezava, todos os domingos, na Igreja da Natividade.
Memórias de muitos anos de reportagens. Reflexões sobre o presente. Saudades das redacções. Histórias.
Hakuna mkate kwa freaks.
Hakuna mkate kwa freaks.
segunda-feira, maio 08, 2006
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Arquivo do blogue
-
▼
2006
(386)
-
▼
maio
(36)
- A organização do Estado
- Despedimento com justa causa
- Angola, 1999. Lágrimas de crocodilo
- Um pormenor da vida, no Iraque
- Farmácias, só mais uma achega...
- Farmácias
- Costaleras do Amor (4)
- Costaleras do Amor (3)
- Congo, ano 2000. Gbadolite, casa chinesa
- Costaleras do Amor (2)
- Congo, ano 2000. Gbadolite, La Chapelle
- Os neo-cons de Dom Sebastião
- Costaleras do Amor (1)
- Congo, ano 2000. A palhota
- A alegria do povo não é o ópio de toda a gente
- Congo, ano 2000. Le Palais Gbadolite
- O Brasil em guerra
- Os Nuba
- Carimbo = Poder
- Congo, ano 2000. A travessia
- Guiné Bissau, guerra civil. O bilhetinho
- Congo, ano 2000. mister John
- Hanan, mais uma vez
- Santo Nyerere
- Guiné Bissau, guerra civil. O sobrevivente
- Nha Terra
- Tarrafal
- Cabo Verde, Tarrafal
- Israel, na primeira Intifada. O crente
- Guiné Bissau, a guerra civil. A crueldade
- Israel, na primeira Intifada. O aristocrata
- Guiné Bissau, a guerra civil. A humilhação
- Pedreira dos Húngaros, Bairro Negro
- Bairro da Torre (2)
- Bairro da Torre
- Guiné Bissau, a guerra civil. A rádio
-
▼
maio
(36)
Acerca de mim
- CN
- Jornalista; Licenciado em Relações Internacionais; Mestrando em Novos Média
3 comentários:
Um pequeno testemunho de que a questão da legitimidade da luta dos palestinianos pela independência não é religiosa.
Não são muçulmanos contra judeus.
É um povo que luta pelo direito a voltar a ser independente.
Um ctólico a rezar pela independência da Palestina. Isso não vem na SIC Notícias!
Cá está a tal questão... não é uma luta religiosa e a memória é curta, a informação a que se acede nos meios "normais" está normalizada, digamos assim... É por um olhar destes, relatado por estas palavras apartidarizadas que revemos a realidade e podemos aferir a verdade. Bem haja.
Enviar um comentário