Memórias de muitos anos de reportagens. Reflexões sobre o presente. Saudades das redacções. Histórias.
Hakuna mkate kwa freaks.











quarta-feira, fevereiro 15, 2006

Rusga na redacção

Há cerca de um mês, o jornal 24 Horas publicou a notícia, genericamente conhecida por “envelope 9”, em que se denunciava o facto dos investigadores judiciais terem recolhido registos de chamadas telefónicas de várias figuras do Estado, e de outros cidadãos, a pretexto de estarem a investigar os contactos do ex-deputado Paulo Pedroso, na altura suspeito de envolvimento no caso de pedofilia da Casa Pia. Quando a notícia saiu, o Procurador Geral da república afirmou, primeiro, que a notícia era falsa. Depois, disse que era incorrecta, que apenas teria sido recolhida informação detalhada relativa aos telefonemas de Paulo Pedroso e de mais ninguém. Mais tarde, o Procurador Geral da República reconheceu estar enganado e que, realmente, havia informações detalhadas dos telefonemas de muitas outras pessoas…
Portanto, a notícia do 24 Horas era verdadeira.
Quando a bronca rebentou, o Procurador Geral da República prometeu um inquérito com carácter de urgência para apurar como tinham ido parar ao processo os registos telefónicos de pessoas completamente desligadas do caso policial alvo das investigações, mas até agora…
Parece, agora, que os investigadores judiciais escolheram o caminho mais fácil: vasculhar nos papéis dos jornalistas, a ver se encontram o link que lhes falta. É um estranho modo de investigar. E é um precedente perigoso. O caderno de notas de um jornalista é como o diário de um confessor. Não devia ser violado, por questões desta natureza. A polícia que aprenda a fazer o seu trabalho.

13 comentários:

Isabela Figueiredo disse...

A procuradoria geral é um lugar de difícil investigação. Nas redacções torna-se tudo muito mais fácil.

ZENsia disse...

Carlos Narciso,
Permita-me colocar-lhe as seguintes questões:

Nunca compreendi muito bem o direito do Jornalista à protecçao das suas fontes quando o que está em causa é a Justiça praticada, diz-se, com imparcialidade. Parece-me, de certa forma e sem querer generalizar, que o jornalista pretende o mediatismo em vez da verdade. (Veja-se o caso do Jornalista americano que fabricava notícias). Por outro lado, parece-me que há o receio em a Justiça julgar também as fontes dos jornalistas.
De que forma poderiam, então, os jornalistas colaborar com a polícia, no que diz respeito à investigação de crimes? Estou a pensar no caso dos médicos, que ao abrigo do seu Código Deontológico também não divulgam o que se passa entre eles e o paciente, excepto se há suspeitas de prática de violência, crime, etc.
De que serve, à sociedade e ao bem dos cidadãos, ter notícias que não levam a mais nenhuma outra consequência que não a de nos deixar a nós, meros leitores, com a sensação de que todos trabalham de costas voltadas uns para os outros, e, nos fica a dúvida acerca da veracidade da notícia e da Justiça praticadas.
A quem serve a falta de colaboração entre organizações, instituições, etc?

N.B.: Não estou de acordo com o que foi feito no caso do jornalista do 24 Horas. Apenas coloco questões pertinentes, paradoxais, pelo menos para mim.

Anónimo disse...

So resta mesmo agradecer a esses jornalistas que continuam na linha de fogo. Um bem hajam!
...Quanto à questionada falta de cooperação entre instituições: conhece algum investigador (seja na área da ciência, tecnologia, ou outra) que trabalhe de graça? Também o jornalista precisa do seu soldo, das suas condições de trabalho e, se tem de respeitar um código de ética... então parece-me que mais nada lhe possa ser exigido.

Anónimo disse...

...Sr.s Jornalistas: com umas colants verdes... e voltávamos a ter o nosso Robin dos Bosques!
Não se esqueçam é de se mudarem para um bosque, nem precisa de ser sinuoso ou escuro. Os "principes" deste país facilmente se esquecem que eles existem e, na pior das hipóteses, para o verão que vem... estarão sem abrigo!

CN disse...

quando os jornalistas não puderem mais garantir o sigilo das suas fontes, acabou-se a liberdade de expressão e de imprensa.
é verdade que um jornalista não é nem padre, nem médico. o jornalismo é apenas um instrumento da liberdade. se quiserem prescindir dele, prescindem também do direito a estar informados e de informar. será tudo bastante mais fácil, quando todos estivermos de bico calado e à mercê da boa vontade dos juízes e políticos.
o sigilo só deveria ser quebrado em situações em que a vida de alguém estivesse em perigo. nunca em questões de crimes menores que homicídio. nunca.
minha querida sensia (enfim, suponho que seja uma querida...), uma notícia, uma reportagem, pode não servir para nada, conforme diz, mas é um acto de liberdade.

ZENsia disse...

Carlos Narciso,
Bem, uma suposta querida a originar comentários anónimos, irónicos e sarcásticos vem apenas reforçar a ideia generalizada que a resistência à mudança, o faz de conta, o políticamente correcto e o salve-se quem puder, são valores/atitudes instaladas e escudadas em clichés como a "Liberdade de Expressão" ou Liberdade conquistada, esta sim uma necessidade fundamental, doa a quem doer.

Resumindo, e relocando a questão principal, de outra forma:

Como é que AS BOAS PRÁTICAS DO JORNALISMO, podem ser estendidas aos clientes finais como é o caso do cidadão comum que além de querer estar devidamente informado, quer ver as instituições a funcionar eficaz e rapidamente na defesa dos seus direitos de cidadão?
Mesmo que hajam anónimos a não gostar da colaboração entre instituições/organismos, será que ela não seria um meio de evitar excessos e abusos de poder, por um lado, ou um mecanismo catalizador das acções subsequentes, por outro?
De que vale ao cidadão estar informado (ginasticando-se entre os vários meios à sua disposição para tirar as suas próprias conclusões) se depois da denúncia jornalística, se instala a inércia porque um já fez a sua parte, e ao outro não interessa prosseguir?
A quem servirá esta "gestão de quintinhas" ?

Grata pela reflexão que queiram fazer.

CN disse...

quando uma instituição não funciona, o jornal denuncia. no dia em que o jornal não puder mais denunciar, o cidadão fica a perder duas vezes, pela instituição que não lhe presta o devido serviço e pelo jornal que deixou de denunciar.
quanto ao valor da informação, nem sei o que lhe dizer. talvez, colocando-lhe outra questão: prefere ter informação e poder escolher, ou não ter de todo informação e "comer e calar"?
só mais um argumento. no dia em que os jornalistas forem obrigados a colaborar com a polícia, ou com os tribunais, quebra-se de vez a relação de confiança entre o jornalista e o público. porque não será mais possível termos a certeza de que a notícia não foi previamente autorizada pelo juíz...

Anónimo disse...

"se depois da denúncia jornalística, se instala a inércia porque um já fez a sua parte, e ao outro não interessa prosseguir?"

então de facto compreende que os jornalistas fazem a sua parte e que a inércia só existe do outro lado. Então qual é a dúvida?

Anónimo disse...

Sou jornalista - penso que não é o caso dos sensia e flor e anónimo que comentaram também. E a questão que me ponho, no meio disto tudo, é porque raio se há-de considerar que os jornalistas são infalíveis? Que utilizaram fontes fiáveis? Porque o juram? Porque o defendem sem provas, salvaguardando a protecção das fontes? Quantas e quantas vezes essas fontes não são as instituições a servirem-se dos jornalistas como veículo de transmissão de ruído para a investigação? Como instrumentos de outros fins mais obscuros ainda? Não creio que possa haver intromissão. Mas é necessária uma melhor colaboração, mais transparente, entre os serviços de comunicação à imprensa da Judiciária e de outros organismos.
E ninguém dá com o vaso em cima da cabeça dessa "flor"?

CN disse...

os jornalistas devem reconfirmar as informações que recolhem. nenhuma fonte deve ser considerada acima de qualquer suspeita, excepto as que tenham dado provas irrefutáveis ao longo do tempo.
é verdade que muitas "investigações" jornalisticas são, apenas, simples caixas de ressonância de grupos de pressão. mas, mesmo assim, acho que os jornalistas não devem ser obrigados a abdicar da protecção das suas fontes. um jornalista não é um polícia, e o contrário também é verdade. assim, cada macaco no seu galho.
e continuo a dizer que a liberdade de expressão vale todos os riscos que se possam correr.

ZENsia disse...

Jornalista Anónim@,
Gostei de ler o seu comentário.
Não, não sou jornalista. Sou sim uma profissional liberal que se rege por um código de ética aprovado na AR e publidado em DR. Sou associada de uma Ordem que pode sancionar-me se esse Código de Ética for infringido, além de ser julgada pelo Direito Comum como qualquer outro cidadão.

O que aqui escrevi, nem necessariamente reflete a minha opinião como fiz questão de deixar em nota. Legítimamnete, quis fazer contrapeso para que pudesse surgir um diálogo aberto, com opiniões contrárias e transigentes. Expectativas guradas. Perdi pontos. Tudo bem.

Sei que o acto da escrita é delicado e que as leituras podem ser as mais variadas de acordo com o background do leitor.

Do seu comentário fiquei a presumir que a classe jornalistica pode estar dividida no que diz respeito à transparência das fontes e à colaboração com outras entidades. Ganhei pontos.

*****
Carlos Narciso,
Continuarei democraticamente a visitar o seu blog para ler as suas memórias que muito aprecio.

Anónimo disse...

Ui que sérios que eles são!... Fui!

CN disse...

Sensia, ganhou a aposta do diálogo. A troca de opiniões que está aqui a acontecer é prova disso. Aprecio, de resto, o papel de "advogado do diabo" que julgo estar a representar. Também o faço, quando o considero pertinente. Não se deixe exasperar pela discussão... é assim mesmo e, obviamente, não passará disso. É bom defender convicções e é bom exercitar contra-argumentação. Acho que os portugueses são, por norma, demasiado condescendentes e demasiado receptivos às ideias dos outros, mesmo que não valham nada. Gosto, por isso, de encontrar teimosos, como a Sensia parece ser.
Sempre que quiser iniciar uma discussão, conte comigo, seja como aliado ou adversário. E se quiser continuar esta, encantado...
De resto, também já espreitei o seu blog. E também continuarei a fazê-lo.
Um abraço.

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Jornalista; Licenciado em Relações Internacionais; Mestrando em Novos Média

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