Memórias de muitos anos de reportagens. Reflexões sobre o presente. Saudades das redacções. Histórias.
Hakuna mkate kwa freaks.











quinta-feira, março 16, 2006

Guiné Bissau, a guerra de 89 (5)

Ao terceiro dia, fomos finalmente autorizados a permanecer num pequeno auberge da cidade, numa espécie de detenção domiciliária. Não podíamos sair dali, sob pretexto algum. Na noite desse terceiro dia, à hora do jantar, a recepção do hotel estava deserta, o telefone em cima do balcão. Em menos de 30 segundos disquei o número de telefone da redacção da RTP em Lisboa (felizmente as ligações já eram directas, sem necessidade de intervenção de uma operadora) e consegui explicar a situação em que me encontrava e onde estava. Desliguei com o coração aos pulos. Nessa noite dormi, finalmente. E enquanto dormia, a diplomacia funcionava. O Ministério dos Negócios Estrangeiros foi alertado, o governo do Senegal contactado, o governador militar de Ziguinchor avisado e, dois dias depois, estavamos livres e expulsos para o lado guineense. O sucedido foi usado pelo poder na Guiné-Bissau como arma de propaganda, como facto revelador da maldade reinante nos espíritos dos senegaleses, que até prendiam os jornalistas portugueses.
Nas semanas seguintes, os ímpetos guerreiros foram contidos e um tratado de paz acabou por ser assinado, cerca de 1 mês depois dos primeiros tiros, na cidade fronteiriça de São Domingos, na Guiné-Bissau.
A guerra de Casamança continuou. O governo guineense traficava armas para a resistência independentista, mais ou menos abertamente. Várias fontes na Guiné-Bissau garantiam-me que o próprio Presidente Nino Vieira era o "patrão" desse negócio.O esforço de guerra da resistência de Casamança era financiado, em boa parte, pelo cultivo e exportação de liamba. A droga era levada -e continua a ser, ainda hoje...- para o mar alto em canoas dos pescadores, onde era transladada para navios cargueiros que se dirigiam para portos europeus. Mas boa parte das armas que chegavam às mãos dos guerrilheiros de Casamança provinham dos paióis do exército guineense, principalmente armamento ligeiro como, por exemplo, kalashnikovs, RPG-7 e minas anti-pessoal. Dez anos depois, este tráfico de armas iria ser o detonador da guerra civil na Guiné-Bissau.

1 comentário:

GLP disse...

Caro Carlos,

Agradeço a sua visita ao Fotojornalismos. Para mim foi um privilégio!
Obrigado pelas amáveis palavras e pelo apoio.

Vou estar atento ao seu blog que me parece-se ser muito interessante, pelo menos a julgar pelas histórias que já li. Parabéns!

Grande abraço

GONÇALO LOBO PINHEIRO
http://fotojornalismos.blogspot.com

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Jornalista; Licenciado em Relações Internacionais; Mestrando em Novos Média

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